
É muito comum nos grupos de Facebook rolar uma defesa ao médico obstetra da família, ou ao obstetra que “fez meu parto normal” ou que “fez a cesárea porque as mulheres pedem” cada vez que sai algum comentário sobre as taxas de cesárea e sobre a prática (não)humanizada de alguns profissionais.
Antes de ser obstetriz, antes de ser doula, eu já era ativista contra violência obstétrica e por isso quero dividir com você minha percepção de quem teve duas cesáreas desnecessárias, depois passou por 21 obstetras pra conseguir um parto natural.
É importante lembrar que ter o direito às taxas de cesárea dos obstetras conveniados foi uma grande conquista das usuárias de plano de saúde graças ao movimento de mulheres e da humanização do parto e temos que olhar para elas sim, pois fazer cesárea sem indicação clínica é colocar mãe e bebê em RISCO. A cesárea “a pedido” é um dos fatores que faz o Brasil ter taxa de morbi-mortalidade materna muito acima do máximo tolerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e ter taxas de internação em UTI (materna e neonatal) muito acima do ideal também. Da mesma forma que uma cesárea bem indicada salva vidas e são, sem sombra de dúvidas, muito bem vindas, as cesáreas sem indicação clínica devem ser evitadas.
No entanto, a Obstetrícia é uma das poucas especialidades médicas que se opta fazer uma cirurgia de grande porte sem indicação clínica. Apesar do Brasil ser um dos países que mais realiza cirurgias de um modo geral, fico imaginando se um ortopedista em um plantão de traumas, recebe um paciente pedindo pra amputar a própria perna porque a dor está alucinante, oferece um anestésico potente ou se ele amputa a perna “a pedido”. Ou em um PS onde uma pessoa chegue com dor abdominal aguda e exija uma cirurgia de apêndice “a pedido”, sem indicação clínica, e o plantonista faça a cirurgia ao invés de oferecer uma solução para o problema que o paciente está enfrentando. Mas obstetra fazer cesárea a pedido pode. Como diz o Bráulio Zorzela, as mulheres não querem cesárea. Elas querem uma boa assistência. Uma assistência segura e humana. Uma assistência onde ela seja informada sobre o que está acontecendo com ela. Uma assistência em que as intervenções sejam realizadas quando necessárias. Uma assistência com equipe multiprofissional. E isso o inquérito nacional Nascer no Brasil mostrou. Por isso, quem tem que se preocupar em melhorar as taxas são os profissionais e não as usuárias em defendê-los.
Então mulheres uni-vos! Já conseguimos avançar muito nos últimos dez anos. A luta e o movimento da humanização do parto não é para “desmoralizar” ninguém não. É direito das mulheres saberem onde elas tem real chance de parto normal e onde elas tem uma cesárea a pedido aceita.