Violência Obstétrica

Exame de toque. Aliado ou vilão?

Por 27 de setembro de 2013Sem comentários

exame-toqueNós que participamos das discussões sobre a humanização da assistência ao parto sempre lemos nos grupos de discussão, que a realização rotineira de exame de toque nas consultas pré-natais em gestações de baixo risco,  não traz benefícios nos desfechos perinatais, e que justamente ao contrário, acaba por contribuir para o aumento significativo da taxa de cesáreas desnecessárias com diagnósticos questionáveis de “falta de dilatação”, “bebê alto”, “colo impérvio”, “falta de passagem”, entre outras pérolas.

Poderia desenvolver esse assunto sobre o porque não faz  o menor sentido a avaliação da dilatação fora do trabalho de parto do ponto de vista fisiológico, ou até pela questão jurídica. Porém já abordamos a questão jurídica quando postamos sobre violência obstétrica aqui, e vou deixar pra escrever sobre o processo de dilatação em outro momento. Neste post, prefiro abordar o assunto sob a ótica social que contribui para movimento de humanização da assistência à mulher.

Se seu obstetra disser que a partir da proxima semana os exames de toque farão parte da rotina das consultas, essa pode ser uma bela oportunidade para você dizer um forte e sonoro NÃO. Acredite, isso tem um fortíssimo e importante papel social.

Cada vez que uma de nós, pobres mortais, questiona um procedimento de rotina, cria a oportunidade para o profissional que foi questionado se atualizar, se informar e questionar suas práticas. Ok, sabemos que a cada 100, com sorte UM questione a própria  prática, mas é assim que contribuimos, paulatinamente, para a mudança do modelo de assistência obstétrica em nossa cidade, estado e país.

É importante,  se  você optar por continuar indo a esse profissional de saúde, dizer que não autoriza o exame de toque porém dar uma dourada na  pílula, sabe como é?

Querido obstetra fofo, já que não estou em trabalho de parto não vou autorizar esse exame de toque, afinal nesses tempos modernos onde se fala tanto em violência obstétrica, andei me informando,  estudei meus direitos (e suas obrigações), e sei que tenho o direito de não me submeter a um procedimento desnecessário, salvo em caso de risco eminente de morte, que não é o caso, afinal eu e meu bebê estamos ótimos, como o senhor acabou de atestar através da ausculta dos batimentos dele. Além disso sei que exames de toque em gestações de baixo risco e a termo, são totalmente desnecessários porque estou meio desocupada e fui estudar algumas meta-analises recentes, e (pasme!), essas meta analises não demonstraram nenhum benefício em se fazer o exame de toque em consultas de pré-natal de rotina“.

(observação: eu procurei e não  encontrei as tal meta analise. Se você que está lendo, já  viu um estudo sobre isso envie pra gente. Se não, deixe o GO fofo pensar que existem, assim ele  pode procurar e por tabela se atualizar rss)

cara de espanto2Prepara-se para a cara de “chocado” que seu obstetra vai fazer. Ou você pode ser direta ( como eu fui com a obstetra do posto que estava me atendendo):

Obstetra do posto: – hum, 36 semanas já? Acho que precisamos fazer um exame de toque.

Eu: – Exame de toque? Não, não precisa, não estou em trabalho de parto (com voz firme, e olhar idem).

Vou contar uma história pra vocês… a maioria sabe que eu e Sophia fomos transferidas. Ela estava bem, mas como nasceu em casa ficou em observação na UTI. Sofremos um terrorismo básico, ou tentativa de terrorismo, por ela ter nascido em casa. O neo da UTI quis condicionar a alta dela  a um ultrassom de fontanela (isso porque estávamos internadas pelo SUS). Então eu disse que não autorizava o ultra. Ele quis me persuadir, dizendo que ela poderia  ter problemas e eu perguntei: OK, o que o senhor  pode fazer HOJE com qualquer resultado que esse US venha a apresentar? Ele: HOJE eu não posso fazer nada. Eu: pois é. Eu sei disso. E um exame, com qualquer diagnostico não serve pra nada se não há nada a fazer. Portanto eu não autorizo o exame e exijo a alta, já que ela  está ÓTIMA e nós dois sabemos disso. No mesmo dia ela saiu da  UTI. E poderia ter saído antes se não fosse a assistência iatrogênica que ela recebeu.

Em resumo, não adianta nada nós sabermos evidências, termos informação se não usamos em prol a quem ainda não tem a informação que nós temos.

Usando a informação que temos para questionar e argumentar, levará os profissionais de saúde a entenderem que a decisão sobre o cuidado pode e deve ser compartilhado com o paciente ou familiares dos pacientes e que o desejo destes deve sempre ser o norteador para exames, intervenções e cirurgias.

E com isso tudo que proseamos aqui, um convite para se deitar em posição de frango assado e receber uma avaliação do colo do útero através de um dolorido (e desnecessário) exame de toque, pode se tornar uma poderosa arma de ação pela mudança que queremos!

 E você? Como pretende fazer para contribuir com a mudança de paradigma no cuidado à saúde?

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